
Em julgamento encerrado na última quarta-feira (08/08), o Supremo Tribunal Federal entendeu, por seis votos a cinco, que inexiste prazo para que o Estado acione agentes públicos em atos dolosos de improbidade administrativa para cobrar o ressarcimento ao erário.
Há muito se discute acerca da possibilidade de prescrição da pretensão ressarcitória do Estado face aos sujeitos vinculados à Administração Pública geradores de danos ao erário através de atos ímprobos, cuja falta de pacificidade jurisprudencial e doutrinária gerava cerca controvérsia jurídica aos aplicadores do direito.
O assunto comporta vasta discussão na doutrina nacional, que conta com sólidos argumentos em suas duas formas de interpretação. Os autores se dividem entre aqueles que defendem a imprescritibilidade das referidas ações e aqueles que afirmam a possibilidade de prescrição.
A lesão ao erário é uma das diversas formas de improbidade no âmbito público, insculpida na Lei n. 8.472/91 (Lei de Improbidade Administrativa).
Ao tema foi suscitada repercussão geral quando do processamento do Recurso Extraordinário n. 852.475, no qual questionou-se acórdão exarado pelo Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) que declarou a prescrição de ação civil pública movida contra funcionários da Prefeitura de Palmares Paulista – SP envolvidos em processo irregular de licitação.
A matéria posta em debate girou em torno da eficácia e extensão do disposto no art. 37, §§4º e 5º da Constituição Federal, que está consubstanciado nas noções de supremacia do interesse público e proteção do erário em face daqueles que se locupletam às custas do tesouro público, e estabelece:
Art. 37 A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:
§ 4º Os atos de improbidade administrativa importarão a suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, na forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível.
§ 5º A lei estabelecerá os prazos de prescrição para ilícitos praticados por qualquer agente, servidor ou não, que causem prejuízos ao erário, ressalvadas as respectivas ações de ressarcimento.
Se por um lado o argumento da imprescritibilidade sustenta-se na necessidade de recomposição do tesouro, bem como a preservação dos pilares do regime jurídico administrativo, a premissa da prescrição homenageia os princípios constitucionais da ampla defesa, contraditório e segurança jurídica.
A procuradora-geral da república, Raquel Dodge, argumentou o enorme impacto negativo aos cofres públicos em caso da manutenção da tese de existência do prazo para ajuizamento da ação. “A decisão evita retrocesso na defesa do patrimônio público, garante a segurança jurídica e a integridade no uso da coisa pública”, afirmou.
O Cadastro Nacional de Condenados por Improbidade Administrativa do CNJ registrou só em 2017 condenações de ressarcimento que, somadas, alcançam a monta de R$ 1,3 bilhão.
Para o ministro Luiz Fux, hoje em dia não é consoante com a postura judicial que danos decorrentes de crimes praticados contra a administração pública fiquem imunes da obrigação com o ressarcimento”.
Votaram pela imprescritibilidade dessas ações: Edson Fachin, Rosa Weber, Celso de Mello, Cármen Lúcia, Luiz Fux e Roberto Barroso.
Foram a favor da fixação do marco temporal: Alexandre de Moraes, Dias Toffoli, Ricardo Lewandowski, Gilmar Mendes e Marco Aurélio.
A tese firmada foi a seguinte: “são imprescritíveis ações de ressarcimento ao erário fundada na prática de ato doloso tipificado na Lei de Improbidade Administrativa”.